Maputo – Em um apelo carregado de simbolismo e crítica social, o filósofo moçambicano Severino Ngoenha refletiu sobre o estado atual do país, traçando um paralelo entre os dias que compõem a Páscoa cristã e os desafios históricos enfrentados pelo povo moçambicano.
Segundo Ngoenha, Moçambique tem vivido por tempo demais preso a uma “Sexta-Feira Santa” permanente, marcada por sofrimento, exclusão e perseguição. Para o pensador, o país tornou-se refém de uma cultura onde o sofrimento foi normalizado, e onde aqueles que ousam ser diferentes ou expressar novas ideias enfrentam hostilidade e repressão.
A metáfora religiosa ganha contornos sociais e políticos ao destacar que, na “Sexta-Feira” moçambicana, morre-se de fome, de medo e de silêncio. E, como se não bastasse, a fase seguinte — o “Sábado” — é ainda mais sombria: caracteriza-se por apatia, desilusão e ausência de esperança.
Ngoenha argumenta que essa fase representa a morte interior do país, onde os cidadãos deixaram de esperar mudanças, os intelectuais se calam e os líderes desviam o olhar diante da fragmentação social.
No entanto, o filósofo aponta uma saída: a cultura do “Domingo”, símbolo da ressurreição. Para ele, mais do que um dogma religioso, esse “Domingo” representa uma decisão coletiva e filosófica de romper com o passado de dor e reerguer a nação com base em novos valores como solidariedade, justiça e reconstrução.
“A cruz não nos define, e a morte não é o nosso fim”, destaca Ngoenha, numa clara exortação à ação cívica e política. Ele defende que a verdadeira ressurreição de Moçambique só ocorrerá quando houver uma mudança profunda de mentalidade e compromisso coletivo com um novo projeto de país.
Ao final, o autor lança um desafio: que esta seja a última Páscoa em que Moçambique aceita viver como se estivesse morto. E que a próxima seja marcada pelo renascimento de uma nação viva, justa e esperançosa.